Carta aberta : Usina hidrelétrica de Belo Monte

Sra. Dilma Rousseff
Presidenta da República Federativa do Brasil

Sra. Presidenta,

Antes de tudo, receba nossa cordial saudação. Nós, da Federação Internacional de Direitos Humanos (FIDH), viemos por meio desta manifestar nosso desacordo com a rejeição demonstrada diante das medidas cautelares emitidas pela Comissão Interamericana de Direitos Humanos (CIDH) em favor da suspensão da construção da usina hidrelétrica de Belo Monte.

Gostaríamos de expressar nossa profunda discordância com o desprezo aos direitos dos povos indígenas na construção da usina. Ao recordar que o Estado Brasileiro deve acatar suas obrigações neste assunto, as medidas cautelares emitidas pela CIDH se increvem no marco normativo internacional vigente sobre direitos de povos indígenas. A este respeito, recordamos especificamente do Convenção 169 da OIT, da qual o Brasil é signatário, bem como da Declaração das Nações Unidas sobre Direitos de Povos Indígenas, também adotada pelo país, que consagram o direito à consulta das comunidades indígenas previamente à aprovação de um projeto que lhes afete, e que esta aprovação está subordinada a seu consentimento prévio, livre e informado. Na mesma linha, a Declaração e Programa de Ação de Viena estabelece que “o desenvolvimento e o respeito aos direitos humanos e às liberdades fundamentais são conceitos interdependentes que se reforçam mutuamente” [1]. Não obstante, no caso de Belo Monte, as comunidades indígenas não foram devidamente consultadas e existem sérios riscos à vida, à integridade pessoal e à saúde de seus membros como consequência da construção da barragem.

Recordamos também que se, por um lado, um caso somente pode ser enviado à CIDH após o esgotamente dos recursos legais internos, por outro, as medidas cautelares emitidas têm um caráter vinculante aos Estados membros da OEA signatários da Convenção Americana de Direitos Humanos. Por isso, repudiamos as declarações do governo brasileiro que afirmam que as medidas cautelares seriam “injustificadas e precipitadas” devido à ausência do esgotamento dos recursos legais internos, e insistimos em sua plena legitimidade e vigência.

Também nos preocupa que, em função da emissão destas medidas cautelares, tenham sido anunciados a suspensão da presença brasileira na CIDH em 2012 e a contribuição financeira anual para este organismo. Efetivamente, nos parece de suma importância para o fortalecimente da democracia nas Américas que o sistema interamericano de proteção aos direitos humanos conte com a participação da maior potência sulamericana, e que conte com uma representação de língua portuguesa.

Cremos que o Brasil, assim como todos os países sulamericanos, podem alcançar um desenvolvimento econômico com respeito aos direitos humanos. Para isso, solicitamos que reconsidere sua posição com relação à suspensão das relações do Brasil com a CIDH, e que cumpra as medidas cautelares emitidas, suspendendo a construção da usina hidrelétrica de Belo Monte até que se realizem devidamente as consultas às comunidades afetadas, e que se adotem medidas para proteger a vida, a saúde e a integridade pessoal de seus integrantes.

Agradecendo sua atenção e confiando que a Sra. tomará a decisão adequada, subscrevemos respeitosamente,

Souhayr Belhassen
Presidenta da FIDH

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