Moçambique

A FIDH e a LDH exortam o governo moçambicano a implementar no mais breve prazo, a totalidade das recomendaçôes

Carta aberta ao Governo de Moçambique: Assassinato do ativista Dr. Anastácio Matavel e restrições ao espaço cívico comprometem as eleições iminentes

O Presidente Filipe Nyusi está pleiteando um segundo mandato de cinco anos nessas eleições. O voto acontece apenas dois meses após Nyusi e o partido de oposição Renamo assinarem um cessar-fogo permanente para interromper o conflito que tem eclodido esporadicamente nos 27 anos desde o final de a guerra civil que se prolongou por 15 anos, matou aproximadamente 1 milhão de pessoas e devastou o país.

O espaço para a sociedade civil em Moçambique tem se deteriorado significativamente desde as eleições municipais de outubro de 2018. Mais recentemente, no dia 7 de outubro de 2019, o defensor de direitos humanos Dr. Anastácio Matavel foi brutalmente assassinado. Dr. Matavel participava de uma sessão de treinamento para a observação eleitoral independente quando foi baleado. Um grupo de cinco indivíduos, quatro deles policiais da ativa, dispararam ao menos 10 vezes contra o veículo do ativista. Ele faleceu no hospital, aos 58 anos de idade.

Dr. Matavel era fundador e Diretor Executivo do Fórum das Organizações Não Governamentais de Gaza (FONGA) e presidente da Assembleia-Geral da Liga das ONGs de Moçambique (JOINT). O seu assassinato é um ataque direto ao engajamento legítimo da sociedade civil no monitoramento independente das eleições. Dr. Matavel acreditava que eleições livres e justas são um fator chave para a consolidação da paz, da democracia e dos direitos humanos necessários para o desenvolvimento de Moçambique.

Em março de 2018, o jornalista e advogado de direitos humanos, Ericino de Salema, foi sequestrado e espancado por indivíduos não-identificados. Até agora não houve detenções relacionadas ao caso e ninguém foi responsabilizado por este ataque. Jornalistas continuam sofrendo intimidação e assédio por expressar visões críticas. No dia 5 de janeiro de 2019, o jornalista Amade Abubacar foi preso, sem mandado, por policiais do distrito de Macomia, enquanto entrevistava camponeses fugindo de ataques de insurgentes. Amade foi mantido em prisão preventiva por quase 100 dias, incluindo 12 dias mantido incomunicável em uma prisão militar. Amade atualmente está esperando seu julgamento.

Uma sociedade civil vibrante é chave para que qualquer democracia prospere. A perseguição à um membro da sociedade civil e ataques brutais, como os descritos anteriormente, deveriam ser condenados de forma rigorosa. Nós exigimos uma investigação imparcial e rápida para assegurar justiça para o Dr. Matavel e todos os ativistas que têm sido alvo de ataques por exercerem seu direito à dissidência independente. Essas e outras restrições ao espaço cívico comprometem profundamente as eleições iminentes, aprofundando o recuo democrático.

Atenciosamente,

Moçambique: Uma missão do Observatório avalia o estado do espaço cívico e a situação dos defensores dos direitos humanos

De 29 de maio a 1 de junho de 2023, uma equipa composta por representantes⋅es da Federação Internacional pelos Direitos Humanos (FIDH) e da sua organização membro na Tanzânia, Legal and Human Rights Centre (LHRC), visitou Maputo, Moçambique. Esta missão teve lugar no âmbito do Observatório para a Protecção dos Defensores dos Direitos Humanos (um programa conjunto da FIDH e da OMCT). O objectivo da missão foi o de reforçar a colaboração na protecção dos defensores dos direitos humanos, em particular com a nova organização membro da FIDH em Moçambique, o Centro para a Democracia e Desenvolvimento (CDD), que se juntou à Federação em Outubro passado.

A equipa, que procurou compreender melhor a situação dos defensores dos direitos humanos no país na perspectiva das eleições municipais de 2023 e das eleições gerais de 2024, teve a oportunidade de se encontrar com representantes da sociedade civil moçambicana, bem como com representantes do Governo nacional e da comunidade internacional. A equipa também teve a oportunidade de discutir o impacto das actividades do sector privado e da indústria extractiva nos direitos humanos e na segurança no país, particularmente no norte do país, com as várias partes interessadas com quem se encontrou.

A missão permitiu conhecer melhor o âmbito de trabalho de CDD em Moçambique, em particular as suas iniciativas relacionadas com a proteção e promoção dos direitos humanos, capacitação dos jovens, os direitos económicos e sociais e a defesa e protecção dos defensores dos direitos humanos. O CDD assegura igualmente o secretariado da Rede Moçambicana dos Defensores dos Direitos Humanos (RMDDH).

Em Moçambique, o Observatório identificou a necessidade de estabelecer representações dos mecanismos nacionais de direitos humanos existentes em todas as províncias do país, particularmente o gabinete do Provedor de Justiça, a Comissão Nacional de Direitos Humanos e a Direção de Direitos Humanos do Ministério da Justiça.

O Observatório se congratula com os recentes desenvolvimentos relativos ao projecto de lei que regula as actividades das organizações sem fins lucrativos em Moçambique. Foi retirado da agenda da última sessão parlamentar, e agora novamente colocado na mesa de consulta. Todas as partes interessadas devem, por conseguinte, levar a cabo um processo de consulta alargado e inclusivo, a fim de ultrapassar os obstáculos à liberdade de associação da forma mais eficaz possível.

Por último, o Observatório apela às autoridades moçambicanas para que respeitem os direitos e liberdades fundamentais para um espaço cívico aberto, bem como para que protejam os defensores dos direitos humanos e jornalistas antes e durante as eleições municipais e gerais de 2023 e 2024, respetivamente. O desenvolvimento e a capacitação de uma rede nacional de defensores dos direitos humanos no país são fundamentais e também ajudarão a construir uma sociedade civil forte.

Após esta missão, o Observatório publicará um relatório sobre a situação dos defensores dos direitos humanos e do espaço cívico em Moçambique, que incluirá análises do padrão de ataques e assédio contra os defensores e organizações de direitos humanos identificados durante a missão, bem como recomendações às autoridades locais e nacionais, e aos organismos regionais e internacionais de direitos humanos.

Moçambique: A protecção dos defensores dos direitos humanos deve estar no centro das prioridades antes das próximas eleições

Paris-Genebra-Maputo, 29 de Setembro de 2023 – O renomado defensor dos direitos humanos Dr. Anastácio Matavel foi brutalmente assassinado em Xai-Xai, província de Gaza, em 7 de Outubro de 2019, uma semana antes das eleições gerais, que ele deveria observar. Este trágico acontecimento, um entre muitos outros ataques, ameaças e repressão aos defensores dos direitos humanos no país, é considerado um ataque directo à sociedade civil no exercício da suas atividades legítimas de observação eleitoral.

Quatro anos depois, com as eleições municipais a realizar em 11 de Outubro de 2023 e as eleições gerais a realizar em 2024 a aproximarem-se rapidamente, a situação dos defensores dos direitos humanos continua crítica, uma vez que a impunidade dos autores de violações dos direitos humanos continua elevada, e à medida que o espaço para a sociedade civil continua a diminuir. Estas são algumas das conclusões de uma missão de terreno realizada pelo Observatório para a Protecção dos Defensores dos Direitos Humanos no final de Maio de 2023 em Maputo, Moçambique, que são hoje divulgadas na nota “Vozes silenciadas. Ataques à Sociedade Civil e aos Defensores dos Direitos Humanos em Moçambique”.

O ambiente operacional para os defensores dos direitos humanos em Moçambique é altamente desafiador. Eles enfrentam constantemente difamação, ameaças, ataques físicos e até assassinatos. A impunidade em casos de crimes cometidos contra defensores dos direitos humanos é, infelizmente, uma prática comum. Os defensores dos direitos fundiários e ambientais, em particular, pagam um preço elevado na sua luta contra a indústria extractiva, como na província de Cabo Delgado”, disse Alice Mogwe, Presidente da FIDH e Directora do DITSHWANELO – o Centro para os Direitos Humanos do Botswana.

O relatório destaca, entre outras tendências de repressão, a ameaça à liberdade de associação constituída pelo atualmente discutido projeto de lei sobre a criação, organização e funcionamento de organizações sem fins lucrativos, a discriminação de facto contra organizações LGBTQIA+, às quais tem sido persistentemente negada o registro legal há décadas, ou a repressão violenta de manifestações pacíficas, como foi o caso das marchas em homenagem ao rapper Azagaia, em Março passado.

Espero que nos próximos dias e meses, antes das eleições gerais de 2024 em Moçambique, vejamos medidas positivas serem tomadas em relação aos defensores dos direitos humanos, tais como medidas concretas para prevenir ataques e assédio contra eles; a promoção de narrativas positivas em torno do papel fundamental que desempenham na sociedade; e a criação de espaço de diálogo e cooperação entre eles e as autoridades ; entre outros“, acrescentou Gerald Staberock, Secretário Geral da OMCT.

O nosso querido amigo Anastácio Matavel pagou o preço máximo por reconhecer que a democracia não se conquista simplesmente sentado numa cadeira; exige sair às ruas e lutar para que as comunidades tenham voz. É por ele e por outros que fizeram tais sacrifícios que persistimos na luta hoje – pelo respeito dos direitos humanos, para honrar a sua memória e, o mais importante, para reforçar a determinação daqueles que acordam todas as manhãs, prontos para garantir que outros possam exercer os seus direitos”, afirmou o Prof. Adriano Nuvunga, Presidente da RMDDH e Director Executivo do Centro para a Democracia e os Direitos Humanos (CDD), organização membro da FIDH em Moçambique.

Leia a nota completa em inglês e português no site da FIDH, em inglês e português no site da OMCT.