Migrações e Direitos Humanos: uma vista geral

07/05/2007
Communiqué
en es fr pt

1. Um fenómeno limitado, mas em expansão

Embora os dados estatísticos continuem a ser deficientes, sobretudo no que se refere às migrações sul-sul, e seja necessário manusear os números com precaução, os migrantes (entre os quais se incluem os refugiados) representariam em 2005 cerca de 200 milhões de pessoas (9,2 milhões de refugiados), ou seja perto de 3 porcento da população mundial. Em termos globais, são portanto falsas as imagens de uma invasão inexorável dos países ricos, se bem que os fluxos migratórios se encontrem em expansão: em 25 anos, o número de migrantes duplicou e todos os indicadores apontam para que vá continuar a aumentar devido às disparidades entre países ricos e países pobres, em matéria de desenvolvimento, demografia e democracia (« os 3 D »).

2. Feminização crescente

Em 2000, as mulheres constituíam um pouco menos de metade dos migrantes e mais de 50 porcento nos países desenvolvidos, mas também na América Latina, nas Caraíbas e na antiga União Soviética. Em número crescente, elas emigram sozinhas, em virtude da procura de empregos tradicionalmente femininos por parte dos países ricos (trabalho doméstico, limpeza, prestação de cuidados a idosos, indústria do sexo), mas também por tomarem consciência dos seus direitos em sociedades onde persistem numerosos constrangimentos restritivos da sua emancipação. Se, por um lado, a relegação das mulheres emigradas para certos tipos de empregos as expõe a violências e a discriminação superiores a qualquer outra categoria de migrantes, por outro o seu percurso migratório realça e reforça a transformação dos papéis tradicionalmente desempenhados por homens e mulheres no plano público e privado.

3. Desenvolvimento de migrações irregulares

Segundo a OCDE, 10 a 15% dos 56 milhões de migrantes residentes na Europa encontram-se-iam em situação administrativa irregular e cerca de 500 mil migrantes sem documentos entrariam todos os anos nos países da UE, tantos como nos EUA. De igual modo, a maioria dos migrantes residentes na África sub-saariana, na Ándia (cerca de 20 milhões, segundo certas estimativas), no Magreb e na América Latina carecem de qualquer estatuto jurídico; segundo cálculos da OIT, 3,5 a 5 milhões de migrantes são empregados pela economia informal na Rússia. Este crescimento da migração irregular está particularmente ligado à diminuição das possibilidades de migração legal e ao desenvolvimento do tráfico de seres humanos (que atingiria mais de meio milhão de pessoas por ano). No decorrer do seu périplo, cada vez mais incerto e prolongado, estes migrantes, sobretudo as mulheres e as crianças, vêem-se sujeitos a múltiplos perigos e a violações dos direitos elementares, apanhados entre dois fogos - as redes criminosas, por um lado, e as políticas de controlo dos estados, por outro.

4. Consequências importantes

Em 2004, as remessas (dinheiro enviado pelos emigrados às suas famílias, que permaneceram no país de origem) transferidas oficialmente atingiram os 150 mil milhões de dólares, ou seja perto do triplo da ajuda pública ao desenvolvimento, ou uma subida de 50 porcento em apenas cinco anos (Banco Mundial). A estes 150 mil milhões deveria acrescentar-se o valor estimado de 300 mil milhões de dólares correspondente às transferências informais. Para certos países, estas remessas podem constituir uma das principais fontes de divisas - senão mesmo a principal (23% do PIB no caso da Jordânia, por exemplo). Para o conjunto dos países em desenvolvimento, estas transferências representam a segunda fonte de financiamento, logo a seguir ao investimento financeiro directo. Para numerosos estados, a imigração é um extraordinário meio de pressão diplomática. Os movimentos de população podem também provocar crises nos países de acolhimento. Em quase todos os países, a questão das migrações é objecto de interrogação, de questionamento, de debate público e de polémica, devido à forte carga ideológica e simbólica do tema.

5. Diversificação dos fluxos e das trajectórias

Cerca de 40 porcento dos migrantes partem à procura de emprego, mas igualmente há outras motivações na origem destes fluxos. Cada vez mais, êxodos importantes de população devem-se a catástrofes naturais (seca, cheias) e a fomes, mas sobretudo a conflitos militares e a guerras civis. Partidas para um país vizinho, em busca de exílio temporário, muitas vezes em grupos de famílias inteiras, estas pessoas, na sua maioria, não têm capacidade para regressar às respectivas regiões de origem. É frequentemente entre elas que são recrutados os futuros imigrantes em situação irregular. As permanências para estudos (mais de um milhão), as migrações familiares (cujo crescimento é um dos fenómenos marcantes das últimas décadas) e « a circulação internacional das elites profissionais » constituem outras formas de migração. Todas as regiões do mundo são afectadas, havendo países de emigração que se transformam em países de imigração ou de trânsito - senão mesmo nos três ao mesmo tempo.

6. Selecção e restrição : regimes jurídicos e estatutos administrativos crescentemente limitativos

A partir da década de 1970, os migrantes viram-se confrontados com dispositivos jurídicos e administrativos marcados pelo proteccionismo e pela selecção. Enquanto a migração ilegal era frequentemente tolerada até essa época, desde então registaram-se reformas de cariz restritivo das condições de entrada, de permanência, de reagrupamento familiar e de acesso ao trabalho por parte de certas categorias (as mulheres, por exemplo). Na Europa, como noutras regiões, as políticas foram-se centrando cada vez mais na « caça ao clandestino » e na detecção do « falso refugiado ». No momento em que a regra é a circulação de mercadorias, de capitais e de serviços, e que, em teoria, a circulação de pessoas se encontra mais facilitada (transportes menos dispendiosos e mais rápidos, etc.), a generalização dos vistos provocou um reforço dos obstáculos. O aumento dos controlos veio criar um novo mercado liderado por redes mafiosas, cada vez mais numerosas e mais bem organizadas.

7. Desenvolvimento de novos pólos migratórios

Os Estados Unidos da América continuam a ser o primeiro pólo de atracção dos migrantes, seguidos da Europa Ocidental (UE e Suíça) e da Austrália. No entanto, a partir do início da década de 1970 afirmaram-se dois novos pólos : os países produtores de petróleo (península arábica, Venezuela, mas também Líbia, Gabão e África austral), por um lado, e os novos países industriais da Ásia, por outro. Nestes novos países de imigração, sobretudo no Médio Oriente, tornou-se regra a precariedade do estatuto jurídico das pessoas, para não dizer a inexistência completa de direitos : contrato temporário, sistema do Kafil(garante), proibição quase total de reagrupamento familiar, expulsões maciças em momentos de inversão da conjuntura económica ou de crise política.

8. Desenvolvimento das migrações sul-sul

Um número ligeiramente superior a 1 em cada 2 migrantes (54 %) reside num país em vias de desenvolvimento. Há quatro razões na origem deste fenómeno crescente : além dos fluxos migratórios clássicos, por vezes com antecedentes muito antigos (do Sahel para a África Ocidental, por exemplo), passaram a prevalecer as migrações « por defeito » : o endurecimento das condições de acesso aos grandes pólos, como a Europa, veio transformar os países de trânsito em países de imigração; assim sucede em Marrocos, na Argélia, na Turquia, no Egipto, na Jordânia - para só referirmos o Mediterrâneo. Em seguida, deve mencionar-se a explosão do número de refugiados, acolhidos na sua maioria na Ásia e em África, em particular na região dos Grandes Lagos e do Corno de África. Por fim, é preciso não esquercer o fluxo de pessoas deslocadas e o fluxo classificado por alguns investigadores como de eco-refugiados.

Lire la suite